2 de novembro de 2010

a ida da morte.

Ás vezes a morte também morre. Sim, que a morte é tão mortal que se mata a si mesma.
E ela, logo ela que tem esse ar malévolo de quem ceifa vidas sem dois segundos precisar, morre como morrem as outras coisas susceptíveis disso mesmo.

Fecha os olhos e num último suspiro, perde forças e voa deste mundo para outro sítio que não se sabe e também ninguém quer saber, porque se já na vida ninguém quer saber da morte, na sua partida então ninguém a pretende seguir.
Não deixa saudades e ninguém fica com pena se ela perdeu a consciência nos últimos minutos de vida, se lhe doeu a cabeça ou o coração ou se alguém lhe segurou na mão até acabar. Afinal é a morte.
Mas lá porque morre não quer dizer que vá e não volte.
E morre de quê, pergunto-me e respondo eu.

Morre daquilo que formos capazes de a matar.
Afogada na panóplia de dias em que lhe escapamos para abusar dos limites de felicidade humana ou carbonizada no brilho alucinante dos sorrisos provocados pelas coisas mágicas da existência. Torturada pela força dos abraços apertados roubados ou oferecidos ou ainda atingida mortalmente por cada disparo provocado por danças frenéticas e espontâneas, vividas sem pensar.

Nem se escolhe a forma mais ou menos dolorosa porque quando se trata de matar a morte com os instantes oferecidos e roubados à plataforma mais alta de felicidade, não se quer pensar.

A morte, só porque é a morte, não exige que se pense com muita consideração, mas pelo menos morre sempre com dignidade.

Haverá melhor forma do que morrer pelos abraços sentidos e longos, pelos sorrisos provocados em altos padrões ou pelos olhares que de tão brilhantes que são conseguem inundar qualquer dia cinzento? 
Ou então porque não morrer do êxtase provocado por rodas que se dão enquanto se dança, porque não partir do mundo enquanto se envolve alguém num olhar e num toque suave e desafiante ou numa canção a uma voz que nos deixa capazes de harmonizar tudo o que dissona em  nós?

A morte morre, uma vez, duas vezes, três e muitas vezes, tantas quantas as vezes que a soubermos afastar de nós.
Morre de mansinho e retorna. 
Morre devagarinho e volta mais. 
Morre com cuidado e renasce. 
Morre a morte, sem nós, tantas vezes. 
E de cada vez que ela morre, sabemos porque morreu sem mesmo fazer autópsias macabras… Morreu porque vivemos mais próximo do limiar exponencial de felicidade, porque alcançámos os patamares mais brilhantes que apenas são permitidos às estrelas maiores.

1 comentário:

  1. por mais infinita, assustadora e irreversivel que a morte seja para muita gente, muitas das vezes as outras opções que a vida nos dá não perspectivam nada melhor que a propria morte.. :c

    gostei do blog, segui ^^

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