25 de outubro de 2010

Unplayed piano.



Outra música daquelas que eu adoro.

A beleza e a magia das músicas que nos tocam está na forma como nos fazem sentir sem mudar nada. Num passe de magia fazem de nós as melhores pessoas, nos melhores momentos, com os melhores pensamentos.
E também há aquelas que deixam saudades devido ao seu timbre, devido ao que dizem enquanto cantam.

A saudade é um sentimento muito forte. 
Deixa-nos atormentados com as memórias que não se repetem, com o brilho dos pedaços mais felizes que fomos e até com aquilo que não chegámos a ser...Sim, que nós temos saudades daquilo que nunca tivemos.
Só queríamos outro abraço ou outro sorriso, outro beijo ou outra conversa... Ou então só queríamos aquele abraço que não chegou e o momento que não passou dos sonhos.
Conseguimos ter mil saudades ao mesmo tempo, mesmo quando não há nenhuma música que nos toca a caixinha de música dentro de nós.


senhora da rua.

 É uma senhora ordinária, no sentido de banalidade da palavra, que se acotovela no parapeito da janela do quarto de sua casa, com vista para a rua. A rua tem um nome e chamam-lhe a rua da Subida. E a senhora, que nome tem mas não interessa sequer para história, costuma ficar a ver as pessoas subirem a ladeira e descerem a Subida. Engraçado não é?,  as contradições literais em que se pode entrar por causa de um nome apenas…

A senhora é da rua. 
Vê as gentes passar com o tempo e o mundo dela gira com esse passar e com esse ver.  A vida dela é absurda e de tão absurda que é, quase nem existe.

É uma sonhadora e imagina as histórias de vida das pessoas que percorrem a Subida.

Ora são uns velhotes ainda apaixonados ou uns idosos suficientemente cansados das loucuras do amor para procurarem outro parceiro para partilharem as arrastadeiras.
Ora são uns jovens de calças rasgadas e cabelos desgrenhados pelas imbecilidades que acabaram de fazer no parque de cedros e amores-perfeitos no cimo da rua ou são uns casais de moços apaixonados que acabaram de descobrir no amor a sua doçura aliada à insensatez.
Ora são pessoas com sacos na mão ou pessoas com sonhos na cabeça, pessoas com caras tristes ou pessoas que vivem da comiseração alheia, pessoas com sorrisos de quem tem uma vida esplêndida ou pessoas que escondem os problemas por baixo da pele inventada.

A senhora da rua anda o dia inteiro à cata dos sonhos, dos problemas, das alegrias e das tristezas dos outros… com esperança que isso resolva a sua vida.
E sabe bem que a sua postura é inadequada para um ser humano - ou pelo menos para um ser humano que queira ser feliz - , mas ainda assim ali continua, presa ao parapeito corriqueiro e à Subida que se desce também.

Às vezes abre a janela para ouvir as vozes dos domingueiros que se passeiam na Subida todos os dias da semana. 
E copia as palavras para cada livrinho.
As bonitas para o livro de cabeceira, as insensatas não copia. As sábias para o livro de cabeceira, as parvoíces não copia. As apaixonadas para o livro de cabeceira, as de desprezo não copia.

O livro de cabeceira tem os sonhos e ela sonha que alguém lhe diga todas essas palavras que copia da rua, do mundo dos outros, do mundo onde as pessoas até descem a rua Subida.
A simpática senhora sabe no fundo que cada pessoa também olha a rua para viver a sua vida, em busca de um modelo de personalidade melhor, em busca de soluções ou reconfortos ou apenas para passar o tempo vazio dos seus mundos, vendo os tempos vivos dos outros.

Ali, àquela janela e na rua da Subida, o que a senhora parece não saber é que o mundo é cá fora, no redoma de vidro e dos cortinados encarnados… mas quando souber, quando tiver já escrito no livrinho de cabeceira as vezes suficientes de que o mundo está à espera para ser vivido, quando rasgar os cortinados e a vergonha que lhe atravessa, infundada, a alma, sairá rua fora, subindo e descendo a rua, passando à frente das janelas de outras senhoras da rua que vêm a vida passar, subir e descer na Subida, que esperam as suas reviravoltas também. 

rebelião.



As maiores revoltas são absolutamente silenciosas e invisíveis. 
Ou estamos a percorrer as ruas, de mãos nos bolsos e o olhar ausente ou estamos sentados num qualquer banco solitário à mercê da vista corriqueira de quem passa e olha sem ver, ou estamos sozinhos rodeados de pessoas que nem ouvem nem vêm o que dentro de nós corre... ou estamos noutro qualquer cenário de todo banal.
Não creio que haja nada mais complexo do que aquilo que cada pessoa guarda dentro de si e aquilo que faz com tudo o que possui. 
Muitas vezes, quando os sistemas que nos coordenam começam a falhar perante o mundo, aquilo que nos falta e aquilo que nos sobra conspiram com o resto do universo uma revolta, secreta, transparente e penosa. 
E quando ela acontece o melhor que fazemos é aceitar as mudanças e as retaliações.
Avaliar, objectivar, ceder, afirmar, melhorar, justificar: todos verbos com significados profundos quando o problema somos nós.
Por muito que se pretenda, dentro de nós, o clima nunca é pacífico num plano a longo prazo. As revoltas irão aparecer de tempos a tempos, quer feitas por nós, quer provocadas em nós.
Quando chegarem será preciso ter a firmeza para as levar connosco, no melhor caminho, até ao fim.
Porque no fim, contas feitas às retaliações e às mudanças, se não tiver valido a pena já saberemos onde regressar... Mas o melhor é que quase sempre vale a pena. E o sentimento de realização, de plenitude, de orgulho... vale a pena, vale muito a pena.

23 de outubro de 2010

love it.




Exogenesis Symphony: Ouverture.

Exogenesis Symphony: Cross-Pollination.

Exogenesis Symphony: Redemption.

Adoro-os... absolutamente!

quotes # 1

"Because without the bitter, baby, the sweet ain't as sweet." 
in Vanilla Sky.

Certo, certo e certo.

 Certo tal como o valor que damos às coisas quando as perdemos, tal como as saudades que sentimos quando por perto as pessoas queridas não temos, tal como o valor que damos aquilo que recuperamos após termos penado pela sua falta...

É por isso que o primeiro sorriso, depois da total ausência de expressões faciais felizes, é sempre o mais sincero e é por isso que guardamos na memória o primeiro abraço daquela pessoa e o segundo primeiro abraço, o terceiro primeiro abraço, o quarto primeiro abraço... 

É que quando perdemos as pessoas por algum tempo, quando as voltamos a ter connosco, temos as primeiras vezes de novo. 

Porque o amargo da ausência devolve a doçura terna das primeiras vezes a certos momentos. Porque o escuro de um período nos mostra a verdadeira pureza de um pedacinho de luz. Porque foi esse caminho estranho que nos mostrou o valor de outras coisas maiores. 

Precisamos dos dois para termos como avaliar. E nós, que somos seres humanos e por isso seres complicados e complexos, com propensão à complexidade exacerbada e à complicação desintegrada, queremos avaliar-nos a nós, aos outros e a nós com os outros. 

O doce e o amargo alimentam-se, mutuamente. 
Sem o amargo, seríamos ser fúteis e superficiais, incapazes de valorizar as coisas mais simples e mágicas da vida. Sem o doce viveríamos acostumados com a penumbra, atados a um banco de pedra fria, vivendo sem prazer e a julgar que a vida era assim, desprovida de brilho. 
O bem e o mal, o doce e o amargo, a metade e a outra metade... resumir-se-à quase tudo a uma questão de equilíbrio?

Seja como for... Because without the bitter, baby, the sweet ain't as sweet. E ainda bem que é assim.


22 de outubro de 2010

leituras.

"Pode ser o perigo que o atrai, pensa. O facto de estar a transpor um limite perigoso. O facto de cada carícia roubada através da objectiva da câmara ser potencialmente letal para ele.
Ou pode ser simplesmente o facto de ela pertencer a outro.
Até agora, ele nunca se apaixonou. Assusta-o um pouco: a intensidade dessa emoção, a maneira como o rosto dela se intromete nos seus pensamentos, a maneira como os seus dedos traçam o nome dela, a maneira como tudo, de algum modo, conspira para que dela nunca lhe saia da cabeça...
Altera o seu comportamento. Torna-o contraditório; ao mesmo tempo mais e menos tolerante. Quer proceder da maneira correcta, mas, ao agir assim, só pensa em si próprio. Quer vê-la, mas quando isso acontece, foge. Quer que dure para sempre, mas ao mesmo tempo deseja que acabe.


(...)


Os demónios foram feitos para serem vencidos. Talvez não com força bruta, mas com inteligência e astúcia. Já sente a semente de um plano a começar a germinar-lhe no subconsciente. Olha mais uma vez para o seu reflexo, endireita os ombros, limpa o sangue da boca e, finalmente, começa a sorrir.
Não se eu te matar primeiro... 
Porque não? Afinal, já o fez antes. "

É muito mais que um romance banal em que tudo gira à volta de amor.
É repleto de complexidade, personalidade, obsessão... de inteligência que se confunde com calculismo.
Tem um toque fenomenal sobre o poder das cores, sobre a influência das rotinas e dos padrões.

Do que li, gosto. Gosto muito.

21 de outubro de 2010

love it.



Hoje dei por mim a sorrir perante o som que uma mala de viagem provoca ao passear-se na calçada. 

Foi isso e a sensação de espontaneidade, a sensação total de liberdade e misticismo, que a mala às costas e o bilhete na mão deixam sentir e que aquela bagagem que levamos nos faz absorver.


Gosto disso... dos bilhetes na mão, dos sentimentos livres, da ansiedade dormente, da saudade e da expectativa, do desejo pela novidade. 

É bom ir, por ir. Ir porque se quer, porque se precisa, porque faz bem... Ir porque sim. 

E é bom saber que se vai voltar e ter esperança que ao regressar o mundo dance melhor e que a música tenha apanhado o ritmo.

E eu sorri. 

Sorri porque há o ir e o voltar. 

20 de outubro de 2010

Reticências

"Arrumar a vida, pôr prateleiras na vontade e na acção. 
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado; 
Mas que bom ter o propósito claro, firme só na clareza, de fazer qualquer coisa! 
Vou fazer as malas para o Definitivo, 
Organizar Álvaro de Campos, 
E amanhã ficar na mesma coisa que antes de ontem — um antes de ontem que é sempre... 
Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei. 
Sorrio ao menos; sempre é alguma coisa o sorrir... 
Produtos românticos, nós todos... 
E se não fôssemos produtos românticos, se calhar não seríamos nada. 
Assim se faz a literatura... 
Santos Deuses, assim até se faz a vida! 
Os outros também são românticos, 
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres, 
Os outros também levam a vida a olhar para as malas a arrumar, 
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos, 
Os outros também são eu. 
Vendedeira da rua cantando o teu pregão como um hino inconsciente,
Rodinha dentada na relojoaria da economia política, 
Mãe, presente ou futura, de mortos no descascar dos Impérios, 
A tua voz chega-me como uma chamada a parte nenhuma, como o silêncio da vida... 
Olho dos papéis que estou pensando em arrumar para a janela, 
Por onde não vi a vendedeira que ouvi por ela, 
E o meu sorriso, que ainda não acabara, inclui uma crítica metafisica. 
Descri de todos os deuses diante de uma secretária por arrumar, 
Fitei de frente todos os destinos pela distração de ouvir apregoando, 
E o meu cansaço é um barco velho que apodrece na praia deserta, 
E com esta imagem de qualquer outro poeta fecho a secretária e o poema... 
Como um deus, não arrumei nem uma coisa nem outra... "

Álvaro de Campos, in "Poemas" 

18 de outubro de 2010

Uma página sem título já o tem e é esse mesmo.
Lá porque não lhe deram um nome bonito não quer dizer que se vá embora com o primeiro vento ou que voando, voe só um momento.
É que o título nem lhe pesa nem a faz mais leve, só lhe dá nome. E o nome só serve para isso, para denominar.
Não é o nome que damos às coisas que definem aquilo que elas são na realidade.
As coisas são as coisas, como são, com os sentimentos que provocam e os momentos que despertam.
Os nomes das coisas são só os nomes das coisas.
Uma coisa sem nome só assim fica até eu resolver rotulá-la. E nem precisa de fazer sentido para ter nome ou não ter.
Mas não mudou nada do que é por isso.
Não é a ausência de um nome concreto para uma parte da nossa vida que lhe retira os valores, os pressupostos, os erros, as lições, as perdas e as vitórias.
O nome é só isso e a falta dele, disso não passa.

reticências.

Antes de ser não  eras de todo,
Nem o sonho, nem vida e amor tão pouco.
Não sei porque chegaste ou porque te busquei,
Se de ingénua me enganei, de ingenuidade morri.

A vida, numa dança cruel, dança,
Um ritmo estupefacto e deslavado,
Sem sedução, música ou esperança.
Não há sol, não há céu, só passado.

As reticências colocadas, com espaço p'ra versos loucos
Que a vida inconsciente escreve aos poucos,
Que os outros não lêem, nem sentem ou levam,
Mas quando alguém perde, eles não perdem.
(Porque só quem ama e tem, perde e perde bem)

Os espaços deixados por preencher ficam até deixarem de o ser.
E essa dança que a vida rodopia, num vai e vem,
Deixa o mundo embriagado de solidão respeitosa,
Encharcado em água ardente de incertezas.

O que fica, ficando se deixa.
O que foi, sendo ficou.
E o que se viveu,
Sem se viver afinal,
Já não volta, já não vem,
Mas dói igual.

14 de outubro de 2010

Digo que.

Eu na verdade gosto de política, gosto de saber a quantas anda (ou não anda) o nosso Governo (ou a falta dele), de ouvir as discussões de ideais e perceber em que ponta eu puxaria. Não sou de ideias radicais e detesto o conflito erróneo que se faz, das coisas erradas, com as pessoas erradas e pelos motivos errados.

Também sei que é fácil apontar defeitos, dizer o que se fazia se fossemos nós a decidir, achar que o mundo seria tão melhor connosco no poder. Somos, fazemos e acontecemos. É assim, quase sempre, não é?
Bem, não é. 

Cada pessoa deve conhecer-se e saber para que competências está talhado. Se alguém se predispõe a exercer a nossa representação, levando a cabo os nossos interesses, assumindo-se como competente para tal, é-nos de direito apontar quando discordamos. 
Devemos estar predispostos a fazer algo. Não apenas a apontar os pontos fracos e a criticar mas também a mostrar disponibilidade para fazer mudança. Como? Pelo menos votando, lendo e ouvindo as boas novas do país, dando a palmadinha nas costas quando se cai e apertando a mão para festejar. Interessando-nos pelo menos, não só para dar o ar de 'ah e tal que culto que eu sou',mas para saber com que linhas nos cozemos. 

Tomar consciência.

E a minha consciência diz-me que o país não vai. Vai arrastado por forças desconhecidas, rolando na sua figura balofa de calças número cinquenta com o cinto a apertar a gordura das classes altas e com os dedos dos pés bem apertados nuns sapatos de pele banal num trinta e cinco de formato pequeno. 

Estão a imaginar? Uma figura de cintura em forma de barril, com passos bem mais pequenos, quase idiotas, aos pulos que a panóplia conjuntural ainda permite dar. 

É, está complicado. Eu não sei que opções sugerir mas sei que o caminho também não está fácil. Está tortuoso e a torturar. 
Dói-nos o peso da má gestão, a descompustura internacional, a respiração sustida pelas medidas e pesos que se impuseram. 

Afaga-nos a vista o visibilidade alcançada pela eleição de Portugal para membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU para o biénio 2011-2012, fazendo par com a Alemanha. 
Servirá, talvez, para mostrar ao mundo que somos um rectângulo pequenino com potencial para explodir em valores, recheados de tradições, pontos vitoriosos de património cultural. 
Pois é, somos um tesouro (escondido ou camuflado, é certo!), pronto a brilhar ao abrir a tampa do baú. 
Só falta isso, não é? 
Abrir a caixinha e sair ao mundo, mostrando o valor que se tem, que não é pouco nem muito, é demais.

13 de outubro de 2010

quando uma vem, nunca vem só.

Quando temos saudades de alguém, temos saudades dessa pessoa ou da pessoa que éramos com ela?
Será que sentimos saudades de todas as suas características ou sentimos a falta das características que realçávamos em nós quando estávamos juntas?

Talvez uma coisa leve à outra. Não poderei sentir saudades de alguém sem sentir verdadeiramente a falta da sua pessoa, daquilo que era, do seu sorriso e do seu olhar, da sua voz, da sua simpatia ou da sua falta de paciência, da sua inteligência ou do seu temperamento, da sua exigência ou da sua preocupação sincera, da sua excelência ou do seu virtuosismo. Do mesmo modo também me é impossível admitir que sentir saudades de alguém não me faça sentir saudades de mim... Dos sorrisos e dos olhares brilhantes, dos planos e dos sonhos fantasiosos e mesmo assim para cumprir um dia, dos momentos de êxtase e autenticidade, dos instantes de cumplicidade... Do tempo que se perdeu (mas que não se perdeu de facto, porque nunca se perde tempo com quem é importante!) a tentar retribuir todo o calor sentido, da magia que se sentia na companhia de quem parece ter voado para longe.

Diria até que se possa ter mais saudades de nós mesmos do que saudades dessa pessoa. Podíamos ter apenas saudades nossas e da nossa felicidade na companhia de quem não está. Mas mesmo assim, tudo isso estaria devidamente justificado com a outra pessoa.
Foi quem nos faz falta que nos despertou tudo isso. Foi quem foi que nos fez ser quem fomos.

Não poderíamos sentir saudades de alguém que pelo menos num momento sequer, nos tivesse feito felizes ou orgulhosos, nos tivesse despertado sorrisos, abraços espontâneos ou olhares amorosos.

E se por acaso nós não tivéssemos sentimentos, então a história seria outra. Apenas nos importaríamos com o nosso bem-estar e quereríamos essa pessoa por perto para nos elevar de novo ao topo onde havíamos chegado.

Mas não. Nós somos máquinas sentimentais, com planos e sonhos e outras coisas que nos deixam em patamares no mundo da lua.
E por isso sentimos. E sentimos a falta dos outros.
Pelo que foram. Pelo que nos fizeram ser. Pela beleza que tinham e faziam o nosso mundo ter. Pela música que saía da sua alma, pelos toques suaves e pela calma, pela festa interior que realizavam... E por conseguirem uma partilha bem plena de tudo isso connosco.

Assim as saudades são sempre duplas. Conseguimos sentir saudades de nós e da pessoa que nos levou a alma. Dos nossos sorrisos e dos sorrisos dela. Dos nossos sonhos e dos sonhos dela. Do nosso mundo e do mundo dela e dos dois juntos, quando num só se metamorfoseavam.
É por isso que doem sempre. Dói-nos o nosso peito e o peito do outro.
Dói-nos a nossa e a saudade do outro.
Quando uma saudade vem, nunca vem só. Traz sempre outra, sem sensibilidade nem dó, para se certificar que se uma apenas faz moer, a outra vem, senta-se e fixa-nos, até doer.

12 de outubro de 2010

só assim.





Penso que há certas coisas mais bonitas à noite,  outras que ao amanhecer têm uma aura mais especial também e certamente que o pôr-do-sol traz magia a outras coisas também.

Ao olhar, pela noite, a cidade, apercebo-me de que há certas coisas que só se podem perceber com a escuridão da noite e com o brilho sedutor das luzes longínquas e que nada nos dizem.

Há coisas que têm que ser, há outras que são porque são, que estão, vão e ficam porque sim.

A aura envolvente de uma noite terna e de um céu limpo e aberto diz-me que tudo tem o seu tempo na vida.

Desde cedo que os nossos professores nos ensinaram que havia tempo para tudo. Mas na altura como o intuito era dizerem-nos que também era importante estudar e empenhar-nos nas lides escolares, a profundidade do pensamento passou-me discretamente. 
Mas voltou. Aliás, muito do que passa por nós no decorrer dos tempos, volta. 
O que damos, é-nos retribuído, acredito, um dia.

É por isso que essa lição de pequena me veio à memória. 

Tudo tem o seu tempo, de verdade.

E é preciso aceitar isso. 
É preciso olhar o mundo, nas diferentes horas do dia, vê-lo e percebe-lo, conhecendo-o aos pouquinhos e dando as mãos como quem namora, nos primeiros dias de Primavera.
Há que saber esperar então, como se espera para olhar o pôr-do-sol. 
Esperar e olhar, como quem espera e olha atentamente a noite que não se conhece mas que se ama, ternamente. 
Como quem se senta de mansinho, apenas para ter um minuto do dia em que a beleza do mundo atinge o expoente máximo. Porque há de facto olhares, sorrisos e toques que só são mágicos quando vividos numa determinada atmosfera. ~
Porque há mesmo momentos que só são especiais quando acontecidos num certo contexto. 
Porque há coisas que são, acontecem e ficam, com simplicidade e inevitabilidade.

Tudo tem o seu tempo, tal como o nascer e o pôr-do-sol. 
Tal como o olhar a noite e ter esperado que as estrelas brilhassem. 
Tal como o olhar o invisível e saber que se encontrou o que estava perdido. 
Há coisas que são mais bonitas assim, daquela maneira, no seu tempo.

Assim, simplesmente.

10 de outubro de 2010

where do we belong?

Quase como algo premeditado, acredito que cada um de nós tem o seu lugar no mundo. Um lugar, no mundo, para cada um. Tal qual terra prometida, cada um com o seu lugar.

Mas ele não nos é dado, ao acaso. Nem sequer nos é dado, habitualmente.

Quando se pergunta onde pertencemos de facto, dizem que o lugar de cada um de nós, é onde está o coração. A resposta poética é, por vezes, uma ausência de resposta, porque nos incita a outra questão: onde temos nós o coração? 

O nosso lugar no mundo não é algo tão simples e banal como escolher onde iremos estar amanhã. É sobre quem estará connosco, o que conseguiremos retirar de lá, quem seremos nós ali. E é também sobre aquilo que abdicamos ao estar ali, com aquelas pessoas e a retirar aquilo que eventualmente retiraremos. O nosso lugar é sobre nós, sobre o mais profundo de nós mesmos.

Dificilmente poderemos pertencer a um sítio onde, contas feitas, tenhamos mais em falta do que em saldo positivo. 

Por isso, o nosso lugar é sempre connosco. Não é estanque nem imutável. O nosso lugar move-se quando se movem os sonhos, as metas e as posições. O nosso lugar adianta-se à mudança e sobrepõe-se às coincidências... Mas deixa-nos o fardo das mudanças. E isso é o que mais custa. Ninguém gosta de despedidas. E nas mudanças, de lugar para lugar, é certo e sabido que há coisas que se esquecem, outras que simplesmente não se encontram mais e outras ainda que se partem, em mil pedaços de vidro. 

Mas depois, chegamos lá.

Lá é para onde os ventos interiores nos inclinam, para onde as tempestades furtivas nos arrastam e para onde o sol nos parece brilhar. Por isso é que, por muito que até fiquemos sempre no mesmo sítio, mudamos muitas vezes de lugar. Porque o nosso lugar é connosco e nós somos uns seres capazes de viajar com o vento, bem num sopro de momento, sem pestanejar.

temos tanto para andar.

Há alguns anos a minha resposta instantânea à pergunta cliché sobre o que queria ser quando fosse grande, era apenas que queria ser feliz. Ao dar essa resposta tinha já na consciência (embora em traços pouco definidos), os seguintes pensamentos: ser feliz é diferente de estar feliz; não queria ser uma pessoa feliz, mas queria ser uma boa pessoa e uma boa pessoa feliz. 

A primeira parte do pensamento daria também um bom tema, mas agora apetece-me mais a parte em segunda posição. Afinal, o que é ser uma boa pessoa? Ou ser uma pessoa má? O que as distingue?

Na verdade eu até poderia listar aquilo que para mim as diferencia.
Generosidade, justeza, imparcialidade, honestidade, preocupação, autonomia, simpatia, perspicácia, sensatez... E tantas outras características que fazem parte de uma lista bonita para as boas pessoas cumprirem. 


Mas a falta de uma qualidade não atira ninguém para uma classificação diferente. O conceito é extremamente complexo, subjectivo e refutável. 

Todos os pensamentos estranhos, variados e complexos me deram a concluir que não posso simplesmente definir ou separar as boas das más pessoas. Talvez nem haja más pessoas, mas pessoas menos boas. Ou se calhar o que existe são pessoas menos más umas que outras, mas que no fundo ninguém se escape do vil fado. 

Suposições não fazem metas, objectivos ou posições.

Hoje sei que mantenho aquilo que queria. 
Quero ser feliz. 
Quero ser (e não apenas estar) feliz e ser (aquilo que no meu entendimento se julga ser) uma boa pessoa. 
Efectivar os valores teóricos que sempre defendi, realizar os sonhos que foram sendo imaginados ao longo da pauta de uma melodia ainda curta mas já decalcada, pincelando em traços pequenos e demarcados todos os pontos futuros que planeio ver na minha tela pintados...

A base talvez seja o respeito.

Mas será? Será o respeito por nós mesmos e pelos outros, a base para ser aquilo que sonhei ser? 
Ou será que este pensamento, um tanto ou quanto demasiado preocupado em separar o trigo do joio, já me torna alguém menos bom porque estou a assumir-me como alguém com capacidade para emitir um juízo de valor sobre algo tão complexo?

Honestamente, não sei... É que a complexidade do assunto requer cuidados extra, por isso não me vou alongar mais.

Sei que irei tentar realizar com toda a convicção os requisitos em lista para chegar ao sonho de menina...

Ser uma pessoa ( pressupondo não ser apenas mais uma pessoa, mas uma pessoa maior e melhor) feliz

E para isso, há muita estrada para andar, muita meta para cortar, muitos sonhos para respirar e muitos valores para mostrar.


6 de outubro de 2010

o primeiro dia.

Há muito que deixei de tentar perceber a complexidade da vida.
Mas como em tudo, vamos aprendendo no decorrer dos tempos que a vida é um caminho cheio... de surpresas, decisões, conhecimentos, erros, lições, sorrisos, emoções, decepções, conquistas e derrotas, vazios, ambições, de ires e voltares.
É uma mistura de etapas e ciclos, de renasceres constantes.


Para se encerrar uma etapa é preciso estar disposto a aceitar as mudanças, os valores conquistados e as coisas que esvaziámos dos bolsos. É preciso saber o que se deixa para trás e o que nem se deixa, porque nunca ali esteve.
Para iniciar outra, é preciso acreditar que se pode ir mais longe, que os valores podem e devem estar presentes, que os objectivos definidos serão atingidos com firmeza. É preciso estar disposto a correr, a dar de nós o melhor.


E o que deve estar presente em nós é a nossa consciência. De quem somos e de quem são os outros, do que queremos e do que queremos connosco e dos outros. Para onde vamos e para onde queremos ir.
Porque a vida não é só aquilo que está ao nível do chão.
Porque "há sempre mil sóis para além das nuvens"! 
Porque os sonhos só se tornam impossíveis quando deles desistimos. 
Porque o brilho da vida está em sermos maiores, em sermos os sóis, em sermos os mecanismos que fazem a vida rodar e a nós com ela, numa dança frenética e rica em conquistas.
Porquê hoje, aqui?
Porque o castelo que eu quero fica acima das nuvens.